segunda-feira, 8 de novembro de 2010

QUANTAS CPMFs LULA AINDA DESEJA?


Se a presidente eleita Dilma Rousseff imaginava que, ao anunciar a possível volta da CPMF como uma demanda dos novos governadores eleitos, conseguiria a simpatia de entidades de classe e da própria sociedade civil, aparentemente ela se enganou. No último final de semana, jornais, blogs e revistas trouxeram reportagens, análises e artigos contestando a volta do imposto do cheque. Abaixo, o resumo de algumas opiniões.
Elio Gaspari, na Folha de S. Paulo: "Durou exatamente três dias a lorota da redução da carga tributária propagada pelo governo e pela oposição durante a campanha eleitoral. Dilma Rousseff foi eleita no domingo (passado) e, na quarta-feira, docemente constrangida, disse que 'tenho visto uma mobilização dos governadores' para recriar o imposto do cheque, a falecida CPMF. Se ela acreditava no que dizia quando pedia votos, anunciaria sua disposição de barrar a criação de um novo imposto. No entanto disse assim: 'Não pretendo enviar ao Congresso a recomposição da CPMF, mas não posso afirmar... Este país vai ser objeto de um processo de negociação com os governadores'. A "mobilização" vem de pelo menos 13 dos 27 governadores, inclusive o tucano Antonio Anastasia. Nenhum deles, nem ela, teve a honestidade de defender a posição durante a campanha. Tentar empurrar a recriação da CPMF como coisa dos governadores é uma ofensa à inteligência do eleitorado que deu 55 milhões à doutora Rousseff.

Estelionato eleitoral
A colunista do jornal O Estado de S. Paulo, Dora Kramer, cutucou: "Se a CPMF é tão necessária e indispensável à melhoria do serviço público de sapude, por que os candidatos a governador e a presidente não fizeram campanha pregando a volta do imposto?"

Por que o Lula quer?
Eliane Cantanhêde, na Folha de S. Paulo: "A candidata Dilma ainda está quente, e a presidente eleita Dilma já sinaliza a possibilidade de ressuscitar a CPMF – algo sobre o qual não abrira a boca durante toda a longuíssima campanha eleitoral.Há um desequilíbrio entre ônus e bônus.

O bônus econômico é questionável. Primeiro, porque a receita da Saúde se manteve praticamente estável antes, durante e depois da CPMF. Segundo, porque a arrecadação vai muito bem, obrigada. A receita cresceu duas vezes mais que a CPMF nos dois mandatos de Lula. Dilma precisa de mais imposto? O mercado acha que não. Nem se sabe ainda se a CPMF voltará, mas os juros disparam na Bolsa de Mercadorias e Futuros.

E o ônus político pode ser pesado. Trazer a CPMF de volta à pauta é mexer com o bolso e com a emoção de quem paga a conta e dar de presente uma boia para a oposição se agarrar, particularmente o DEM.

Se é uma temeridade política sem contrapartida econômica, resta uma conclusão: a CPMF é mais um voluntarismo de Lula. Com tantas vitórias, ele não suporta a ideia de conviver com essa doída derrota no Congresso e quer rebobinar o filme. Depois de 'caçar' adversários e conclamar o 'extermínio' da oposição, agora quer vingança.

Opinões divididas

Reportagem de Lourival Sant' Anna, de O Estado de S.Paulo: "A discussão acerca da volta da CPMF é um caminho cheio de bifurcações. A primeira separa os que acreditam que a saúde no Brasil precisa de mais dinheiro dos que preferem melhor gestão. Mais adiante, os que concordam que precisa de mais dinheiro também se dividem, entre os que acreditam que o Estado precisa arrecadar mais e os que acham que ele deve cortar gastos noutras áreas e destinar o excedente à saúde. Há ainda os que gostam da CPMF e os que a consideram um tributo ruim.

"O problema do setor da saúde, nos níveis federal, estadual e municipal, não é de escassez de recursos, mas de sua má alocação, de gestão", rechaça Marcelo Piancastelli, especialista em finanças públicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), do governo federal. "Os Estados não estão precisando, mas querendo mais dinheiro. Acho absurdo."

A economia deve crescer 7,5% este ano e a arrecadação, entre 17% e 18%. "Com esse aumento estupendo de arrecadação, falar em aumentar a carga tributária é escandaloso", critica o consultor Clóvis Panzarini, coordenador da Administração Tributária da Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo entre 1995 e 2002.

"Claro que existe um problema fiscal nos Estados, mas é por conta da absoluta liberalidade", analisa o consultor e professor Everardo Maciel. Secretário da Receita Federal também entre 1995 e 2002, no governo Fernando Henrique Cardoso, Maciel aponta que as 'competências concorrentes' entre União, Estados e municípios, sobretudo na saúde, educação e, de forma crescente, na segurança pública, abrem as torneiras dos gastos.

O primeiro recuo de Dilma

Editorial de O Estado de S. Paulo: "A promessa da presidente eleita de conter o gasto, controlar sua qualidade e aliviar a tributação já está prejudicada. Ela se declarou disposta a discutir a recriação do malfadado imposto sobre o cheque, a CPMF, uma das maiores aberrações do sistema tributário brasileiro. O recuo indisfarçável ocorreu na entrevista no Palácio do Planalto, na qual, primeiro, negou a intenção de mandar ao Congresso uma proposta sobre o assunto e, depois, prometeu conversar com os governadores favoráveis à contribuição. Ao anunciar essa disposição, não apenas tornou seu discurso ambíguo, mas abriu uma brecha nos compromissos formulados na primeira fala depois da eleição.

O presidente Lula levantou o assunto antes da entrevista de sua sucessora. Ele mais uma vez lamentou a extinção da CPMF e acusou a oposição de haver prejudicado a maioria dos brasileiros. Mas os R$ 40 bilhões anuais da CPMF nunca fizeram falta para a política de saúde. Se o presidente quisesse, poderia ter destinado verbas maiores a esses programas. Bastaria conter despesas menos importantes ou claramente improdutivas.

Discurso ambíguo

No blog de Reinaldo Azevedo: "Ela (Dilma Rousseff) vai tentar recriar a CPMF ou não? Não dá para saber. Já há elementos para concluir uma coisa e seu contrário. O que se tem como certo é que, caso a proposta volte a ser debatida, o governo Dilma vai exigir a cumplicidade da oposição. Sabemos agora, também, que não existe, então, dinheiro para cumprir todas as promessas feitas durante a campanha eleitoral. Dilma se esqueceu de dizer, enquanto pedia votos, com quais recursos pretendia pôr em prática a sua 'revolução" na área da saúde.

O truque já está evidente: vão fazer o ensaio para recriar o imposto, sim. Se a oposição não topar dividir esse ônus, o governo tentará jogar nas suas costas a responsabilidade pelo caos que vive a área. Caberá aos oposicionistas cair no truque ou, bem…, fazer política."

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